Abraça tem nova Diretoria

Feenanda Santana durante apresentação no 1º Encontro Brasileiro de Pessoas Autistas

Abraça tem nova Diretoria

Nova presidenta irá zelar pelo protagonismo de todas as pessoas autistas

A Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas com Autismo (Abraça), organização nacional de defesa dos direitos humanos das pessoas com autismo, acaba de eleger sua nova diretoria para o período de 2017 – 2020.

A partir de primeiro de janeiro de 2017, a composição da ABRAÇA passa a ser:

  • Presidenta: Fernanda Santana (PR)
  • Secretário Geral: Alexandre Mapurunga (CE)
  • Tesoureira: Flor Saldanha (CE)
  • Diretoria de Assuntos Jurídicos: Maristela Lugon (ES)
  • Diretoria De Comunicação: Meri Sandra (TO)
  • Vice-Presidências:
    • Norte: Cristina Dias (AM)
    • Nordeste: Mariene Maciel (BA)
    • Sul: Renata Bonotto (RS)
    • Sudeste: Maurício Moreira(MG)
  • Conselho Fiscal:
    • Daniele Lima (CE)
    • Janaina Almeida (AL)
    • Artur Holanda (CE)
Alexandre Mapurunga, ex-presidente da Abraça, agora Secretário Geral

Alexandre Mapurunga, ex-presidente da Abraça, agora Secretário Geral

Alexandre Mapurunga que esteve à frente da presidência de 2012 até agora, destaca que termina o mandato satisfeito com as muitas realizações, mas certo de que ainda há muito a ser feito.

No período em que Alexandre esteve na presidência a organização se destacou na luta por inclusão e direitos humanos das pessoas autistas em diversos campos. Houve a atuação direta na formulação da Lei 12.764/2012 e na mobilização na luta pelos vetos presidenciais aos artigos que isentavam de punição os dirigentes escolares que discriminavam as pessoas autistas, além da participação na elaboração do decreto que regulamentou a Lei.

Entre 2014 e 2015, foram realizadas oficinas de capacitação em direitos humanos das pessoas com deficiência para organizações de pessoas autistas nas cinco regiões do país, mais especificamente nas cidades de Fortaleza, Belo Horizonte, Porto Alegre, Manaus e Goiânia.

Foram feitas, também, diversas intervenções junto à ONU – Organização das Nações Unidas, tanto em Genebra quanto em Nova Iorque. Na ocasião foram denunciados o desrespeito e violações que pessoas autistas e com outras deficiências sofriam (e ainda sofrem) em todo o Brasil.

A Abraça foi responsável pela elaboração do Relatório da Sociedade Civil para revisão Brasileira no Comitê das Nações Unidas Sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Na área da conscientização da sociedade, foram realizadas diversas campanhas de conscientização da inclusão, da situação de violação de direitos que pessoas com deficiência ainda enfrentam no país e a desmistificação de estereótipos ligados à pessoa autista e ao autismo.

A Abraça foi, ainda, ‘Amicus Curie’ junto ao STF – Supremo Tribunal Federal na ADI _ Ação Direta de Inconstitucionalidade número 5357, onde defendeu e, o mais importante, comprovou a tese de que é inconstitucional negar matrícula e cobrar valores adicionais em função da deficiência.

Para coroar esse período de grandes conquistas, foi realizado o ‘1º Encontro Brasileiro de Pessoas Autistas (EBA)’ – primeiro evento idealizado, organizado e protagonizado por pessoas autistas de todo Brasil e do exterior. Uma ação inédita que deu voz e comprovou que os autistas podem e são os protagonistas de sua própria história.

Muitos foram os desafios enfrentados como a falta de recursos financeiros para realizar todas essas as ações, como a carência de pessoal dedicado para fazer as coisas acontecerem. Mas, com muito foco e esforço, nada disso impediu o avanço da entidade.

Agora, com a nova composição da Diretoria, a presidência vai para Fernanda Santana, uma jovem autista de Curitiba-Pr. Mapurunga passa para Secretaria Geral. Os demais membros são todos, pessoas que participam ativamente e continuamente das discussões coletivas. O atual Secretário ressalta que “temos o nosso estatuto com os nossos princípios que orientam nossas ações. A diretoria tem membros de todo o Brasil, vice-presidências na cinco regiões, coordenações estaduais e organizações membro em vários estados. Para encurtar distâncias, fazemos reuniões virtuais regularmente e reuniões presenciais sempre que possível.” Além disso, continua Mapurunga, “estamos muito animados com a perspectiva de Fernanda na presidência, pois ela resume nossos anseios de inclusão e representatividade. Sua vivência como mulher autista tem muito a adicionar à nossa atuação.”

Feenanda Santana durante apresentação no 1º Encontro Brasileiro de Pessoas Autistas

Fernanda Santana, nova presidenta da Abraça

Fernanda Santana, a nova presidenta da Abraça, reforça a preocupação com a promoção e defesa dos Direitos Humanos das pessoas autistas. A nova presidenta é do Paraná, tem 27 anos e é estudante de Arquitetura e Urbanismo.

A descoberta do autismo aconteceu quando a Fernanda tinha por volta de 20 anos. Ela cursava Letras (licenciatura), e foi a primeira vez que teve contato com o conceito de Autismo, em uma disciplina sobre dificuldades de aprendizagem.

Fernanda sempre teve vontade de se envolver com ativismo, mas por muito tempo, pareceu algo complicado demais para ela. A presidenta explica que falar com pessoas, se expor, se impor, isso tudo era assustador. E completa, “Na época, eu não conseguia ir comprar um pão sozinha, não falava ao telefone por nada no mundo e a ideia de contestar alguém desconhecido me dava arrepios. Todos os grupos de ativismo que eu encontrava pareciam ser grupos de pais, e a linha de trabalho deles não era compatível com aquilo no que eu acreditava. Então por muito tempo eu me limitei às redes sociais.”

Para a presidenta a “internet é algo maravilhoso pra alguém autista. A internet é libertadora”. Ela conheceu muita gente online e teve acesso a informações preciosas sobre o que acontecia em outros países, como o Movimento pela Neurodiversidade, entre outros. Incentivada pelo noivo, ela percebeu que podia mais. Embora não tenha sido fácil, deu certo.

Da ideia à ação, Fernanda gravou vídeo comemorativo para o Dia Mundial de Conscientização do Autismo, 2 de abril e, com muito receio, divulgou no YouTube. O retorno foi surpreendente, muito além do imaginado.

Depois disso, uma colega da moderação de um grupo do face, conhecida de anos e membro da Abraça, apresentou Fernanda ao presidente anterior, Alexandre Mapurunga. A identificação com o grupo foi imediata.

Fernanda Santana ressalta que já houve avanços na sociedade para os autistas. Cita que existe uma série de ferramentas úteis para o suporte na luta por direitos, como a Lei 12.764/2012 (que reconhece o autismo como deficiência e proíbe que seja negada a matrícula em escola regular), a Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e, é claro, a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (tratado internacional ratificado pelo Brasil por meio dos decretos legislativo 186/2008 e executivo 6.949/2009). Enfatiza, porém, que apesar de tudo isso ser importante, ainda há muito a ser feito. Ela explica: “Seguimos lidando com uma série de questões relacionadas ao preconceito, à discriminação, à más práticas, à violência e à negação de uma série desses direitos que as leis nos garantem. É preciso garantir que elas sejam integralmente postas em prática.”

Assim, os maiores desafios são “a mudança de paradigmas e a aceitação do Autismo como uma expressão da diversidade humana. Enquanto o Autismo seguir sendo representado no imaginário das pessoas como uma doença terrível que precisa ser curada urgentemente e a qualquer custo, não vamos ter o suporte necessário pra chegar aonde queremos, que é viver com dignidade, igualdade de direitos e qualidade de vida.”

A presidenta continua: “A busca por uma cura miraculosa implica em muito tempo, energia e dinheiro investidos, deixando de lado o que realmente importa.” Para Fernanda “Precisamos de oportunidades e de apoio, de educação inclusiva, de trabalho e de respeito.”

A esperança, para a nova presidenta vem do fato de o mundo estar mais inclusivo. Para ela, “Muita gente trabalhou muito duro pra isso. Por isso temos as leis que temos. Mas estamos ainda no meio do caminho. Quando a gente sai na rua é muito fácil perceber que, quando o assunto é deficiência (de qualquer tipo!), o discurso ainda é predominantemente caritativo e médico. Essa é uma barreira que ainda precisa ser vencida.”

Fernanda analisa que é muito trabalhoso lutar pelos direitos do autista num país tão grande e tão diverso quanto o nosso. É preciso desenvolver uma agenda que englobe as necessidades dessa gente toda, mas ela explica que o mais difícil, para uma organização como a Abraça, é levar em conta as necessidades e interesses de todos os autistas, não apenas de alguns. Para a presidenta, “Quando a gente fala de autismo a gente precisa falar do espectro todo, e isso implica em saber do que precisa um autista não-falante hoje, seja adulto ou criança, e do que precisa um autista considerado de “alto funcionamento”, hoje, seja também adulto ou criança.” Fernanda acredita que, para que isso aconteça, as pessoas autistas, de todos os ditos “graus de funcionamento”, de todas as idades, de todos os lugares, precisam ser ouvidas. E finaliza: “Ninguém pode ficar pra trás. Esse é o nosso desafio, lembrar de todo mundo”.

O plano de ação para o mandato que se inicia não é só plano de ação, é um compromisso, segundo Fernanda Santana: “zelar pelo protagonismo da pessoa autista dentro do movimento, não esquecer das necessidades daqueles que não podem (ainda) falar por si mesmos, e buscar dar voz às pessoas, mesmo àquelas que não se comunicam da forma mais tradicional.”

A presidenta conclui ressaltando que “Todos somos pessoas completas, com direitos, deveres, anseios, medos e vontades. Isso precisa ser entendido pela sociedade, precisamos da nossa humanidade de volta e pra isso temos que desfazer uma série de mitos que foram se criando com o tempo. É por aí que vamos começar, sendo realistas e contestando sem medo.”

Então, mãos à obra. Boa sorte à toda nova Diretoria da Abraça.

Reportagem de Selma Sueli Silva,
autista e jornalista.

 

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