30 mar Autista Também Tem Fome
O mundo vive uma prolongada crise sanitária com efeitos na vida de toda a população. No entanto, os impactos da pandemia sobre as pessoas autistas e suas famílias aconteceram e acontecem de forma desproporcional, seja nas questões relacionadas à saúde, educação, trabalho, mobilidade, acesso a serviços, proteção de direitos humanos, seja nas questões relacionadas à proteção social, segurança alimentar e moradia. Soma-se à piora do quadro humanitário a duradoura crise econômica que tem empobrecido populações e feito ressurgir com força a fome no país.
Segundo a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), a insegurança alimentar ocorre quando uma pessoa ou sua família não possui acesso a alimentos saudáveis e que sejam suficientes para satisfazer as suas necessidades. De acordo com os dados da FAO, entre 2018 e 2020, o Brasil aumentou em 5% a prevalência de insegurança alimentar grave e moderada. Já em 2021, segundo dados do Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, mais de 55% das residências passaram por algum nível de insegurança alimentar, e a fome foi uma realidade em 9% dos domicílios no país.
Não existem dados desagregados sobre deficiência nas pesquisas relativas à insegurança alimentar, no entanto, é amplamente reconhecido que as crises econômicas atingem mais duramente grupos marginalizados como são as pessoas com deficiências, dentre as quais, as pessoas autistas. O capacitismo estruturalmente colocado a partir da falta de acesso a serviços e recursos essenciais, a falta de apoios, a discriminação sistemática faz com que o impacto negativo seja muito maior.
Nesse contexto, a deficiência se intersecciona com gênero, raça e classe ampliando os impactos negativos da crise a partir desses múltiplos fatores estruturais de opressão. Soma-se à situação a precarização das políticas públicas, uma vez que os encaminhamentos aos órgãos de Estado que lidam com a proteção social tem tido uma resposta cada vez mais demorada e menos efetiva.
Outro fator importante tem sido o retorno da inflação, que faz o custo de vida da população aumentar, em particular para aquelas pessoas que têm os custos extras associados à deficiência como parte do orçamento, tais como alimentação específica, medicação, necessidade de acompanhante etc.
Na Abraça temos experienciado um número crescente de pessoas autistas e suas famílias passando dificuldades e necessitando pedir ajuda financeira para comprar alimentos ou para pagar as contas básicas de casa como aluguel, água, luz, internet, o que corrobora com o quadro apresentado nos estudos. Nestes casos, o apoio tem sido providenciado a partir de gestos de solidariedade dentro da própria comunidade autista e de apoiadores, de maneira emergencial, por meio de cotas e vaquinhas.
Neste contexto, a Abraça resolveu lançar o programa Autista Também Tem Fome: ação solidária que visa possibilitar o apoio a pessoas autistas em situação de insegurança alimentar e/ou vulnerabilidade habitacional, além de prestar acolhimento social, orientação e encaminhamento para políticas públicas de proteção social.
As pessoas autistas e suas famílias têm direito à proteção social e a um padrão de vida adequado. Não é justo que as pessoas com deficiência tenham que escolher entre se alimentar e acomodar suas necessidades específicas. É preciso assegurar o acesso de pessoas com deficiência, particularmente mulheres, crianças e idosos com deficiência, a programas de proteção social e de redução da pobreza, bem como às ações emergenciais, como a distribuição de cestas básicas.
Você pode fazer algo cobrando das autoridades, orientando pessoas que estão passando por esta situação e doando para ajudar uma pessoa autista, diretamente ou através do programa Autista Também Tem Fome de nossa organização. Vamos à luta!
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA PARA AÇÃO PELOS DIREITOS DAS PESSOAS AUTISTAS